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7 motivos para assistir Big Little Lies

7 motivos para assistir Big Little Lies

Big little lies, baseada no livro homônimo de Liane Moriarty, estreou na HBO em fevereiro. Mas eu não assisti na estreia. Vi trechos de alguns episódios quando reprisaram há cerca de um mês e me interessei. Achei a série no NOW e comecei a assistir numa noite de insônia, há alguns dias.

 
Então vamos aos 7 motivos para assisti-la e recomendá-la:

 

A quantidade de episódios

A série tem apenas 7 episódios, ou seja, não precisamos nos comprometer por dias a fio para chegar ao final. São episódios longos, com quase uma hora de duração, nos deixando absortos quase como se assistíssemos a um filme. O primeiro episódio talvez afaste algumas pessoas, pois o ritmo é um pouco lento. Mas depois que o espectador se vir envolvido pela história, é difícil parar de assistir – mesmo que os episódios não tenham cliffhangers no final.

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A narrativa

A estrutura da narrativa é bem semelhante a Damages (com Glenn Close) e, citando uma série mais recente, a How to get away with murder (com Viola Davis). Algo acontece “no presente” e a narrativa vai e volta no tempo, mostrando como cada personagem chegou àquele ponto. A diferença, nessa série, é que se sabe apenas que houve uma morte, mas não se sabe quem é a vítima, se foi um acidente ou um assassinato e, no último caso, quem foi o(a) culpado(a). Todas as testemunhas que aparecem sendo interrogadas no presente são personagens secundários que, além de contarem o que presenciaram na festa em que ocorreu o incidente, falam suas impressões e opiniões sobre as pessoas envolvidas. Os diálogos são bem escritos, a ponto de não darem qualquer pista sobre quem morreu ou quem matou, se é que matou. A estrutura é similar à do livro, mas funcionou melhor na série, principalmente por causa dos recursos visuais. É difícil, no livro, guardar o nome de tantas testemunhas que pouco participam da história. Enquanto que, na série, o espectador as identifica facilmente.

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O subtexto

A princípio, a série pode parecer uma mistura de Desperate housewives com Pretty little liars. Mas não é só isso. A história resvala numa trama policial, deixando o público interessado em descobrir quem, como, quem, por quê. Mas vai muito além disso. Tudo se passa numa cidade litorânea, Monterey, cujos moradores têm um certo padrão de vida. As paisagens são sensacionais; as praias, com um visual espetacular. Tudo muito lindo, tudo muito elegante. Tudo perfeito demais. E, sob essa aparência idílica, há coisas terríveis acontecendo. O contraste é um elemento muito bem trabalhado na narrativa. Tanto entre a vida pacata da cidade e a brutalidade do ocorrido, ou mesmo a violência (física ou psicológica) subjacente a alguns relacionamentos. Quanto entre o que as pessoas aparentam e o que realmente são e pensam – este último perfeitamente explicitado nos interrógatórios, quando fica evidente a divergência entre o que as testemunhas conhecem sobre as personagens principais e a realidade de cada uma delas. E não se trata apenas de como as pessoas enxergam umas às outras, mas também como querem ser vistas. É uma crítica forte a uma sociedade focada nas aparências. Não apenas na aparência física, mas nas roupas, no penteado, no carro que dirigem, na profissão que exercem. É algo que foi transposto com eficiência do livro para a tela. No livro, em muitos trechos, um parágrafo descreve a representação máxima da felicidade, enquanto o parágrafo seguinte desmente taxativamente essa afirmação.

“O dia seria perfeito em todos os aspectos. As fotos do Facebook não mentiriam. Tanta alegria. Isso era um fato.
Poderia esperar os filhos terminarem o ensino médio para deixar o marido.
Esta seria a hora certa. No dia em que eles terminassem as últimas provas. ‘Guardem as canetas’, diriam os supervisores da prova. E então Celeste daria fim ao casamento.”

Outro trunfo do roteiro, foi conseguir transformar o discurso indireto livre usado no livro – como se pode ver acima – em cenas que traduzem perfeitamente o sentimento das personagens. Isso é obtido não apenas com a inserção de diálogos, mas também com a montagem (que comentarei mais adiante). David E. Kelley acertou a mão mais uma vez. Para quem não lembra, ele é responsável pelos roteiros de muitas outras séries bem sucedidas, como Boston Legal, Ally McBeal, The practice, Chicago Hope. Além disso, ele conseguiu manter o humor negro e as tiradas sarcásticas que recheiam o livro, que têm papel importante na crítica ácida ao status quo. Lógico que várias coisas tiveram de ser alteradas para garantir a qualidade da transição de uma mídia a outra. Algumas soluções narrativas de Kelley ficaram tão boas que ouso afirmar que ficaram quase melhores que no livro.

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O elenco

Irrepreensível. Nâo há muito mais a comentar. As cinco mulheres envolvidas na trama são nada menos que Nicole Kidman (Celeste Wright), Reese Whiterspoon (Madeline Martha Mackenzie), Laura Dern (Renata Klein), Shailene Woodley (Jane Chapman) e Zoë Kravitz (Bonnie Carlson). Sobre as três primeiras não há nada a comentar, todas ótimas atrizes e perfeitas em seus papéis. Shailene Woodley consegue finalmente se livrar do ranço de Divergent e mostrar que tem talento de verdade. A intensidade com que interpreta Jane é surpreendente, em alguns momentos. E Zoë Kravitz – sim, é a filha de Lenny Kravitz – que também estava com Woodley em Divergent, já tinha mostrado a que veio em Mad Max: Fury Road. Desde o primeiro episódio, percebe-se que é um “girl movie”. Apesar de os eventos girarem em torno dos pais (não o plural de “pai”, mas no sentido de “pai/mãe”) das crianças que estão começando na escola – Ziggy Chapman, Chloe Mackenzie, Josh e Max Wright, Amabella Klein e Skye Carlton – os homens são meio que coadjuvantes, exceto em uma ou outra cena. E isso se reflete na escolha do elenco masculino. Os mais conhecidos são Alexander Skarsgård (Perry Wright), o vampirão Eric Northman em True blood, e James Tupper (Nathan Carlton), o David Clarke de Revenge. Completam o quarteto Adam Scott (Ed Mackenzie) e Jeffrey Nordling (Gordon Klein).

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O diretor

Responsável pelo ótimo e premiadoDallas Buyers Club e Wild, Vallée volta a trabalhar com Whiterspoon. Jean-Marc Vallée dirigiu todos os episódios. Assim como David E.Kelley roteirizou todos os episódios. Só isso já seria o suficiente para me convencer a assistir à série. Mas também é algo que garante aos episódios uma unicidade indelével. Vallée consegue dar vida à narrativa não linear de Kelley, sem saltos abruptos, controlando a luz e a paleta de cores para conduzir o leitor e informá-lo se é o passado ou o presente.

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A fotografia e a montagem

Difícil falar de uma sem comentar sobre a outra. Vallée mescla um ar documental, usando câmera na mão, com tomadas abertas seja de áreas internas ou externas. Usa os clássicos planos americanos e closes em sequências cuidadosamente encadeadas para confundir o espectador, mostrando-lhe apenas o que o diretor e o roteirista querem que seja visto, nem mais nem menos. O último episódio é de tirar o fôlego, não só pela revelação dos mistérios mas pela montagem ágil que, suprindo a ausência de diálogos, ajuda a explicar tudo apenas com imagens. A cena do clímax é intercalada de planos curtos de ondas estourando na praia numa metáfora visual que nem precisa de explicação.

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A trilha sonora

Irretocável. Escrevo agora ao som dela. As músicas não são só muito boas, mas complementam a trama tanto com a melodia quanto com a letra. E o mais interessante é que, diferente de outras séries e filmes, a música é um elemento diegético. Quando não é a pequena Chloe comandando seu iPod e escolhando o que ouvir em casa ou no carro, é Ziggy assistindo a show na tv, ou são os concorrentes cantando na festa em que “aquilo” acontece, cujo tema é Elvis Presley e Audrey Hepburn.

Nâo há mais o que dizer, só ouvir:

Nesta entrevista, Jean-Marc Vallée explica suas escolhas:
How The Music Of ‘Big Little Lies’ Is Telling The Most Interesting Story Of The Show


Só mais um comentário. Sobre a identidade da vítima, a legenda em português matou parte do mistério, ao flexionar substantivos e adjetivos quando os personagens falavam a respeito. Em inglês, os imparciais “the body” e “the dead” mantêm o suspense. Em português, logo se sabe o sexo de quem morreu, facilitando descobrir quem foi a vítima.

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